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Índios Tapuia, Secretaria de Educação e Câmara Municipal dialogam pelo ensino indígena |
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Índios na Audiência Pública em Macaíba |
Os índios Tapuia da
comunidade do Tapará estão caminhando a passos largos para mais uma conquista.
Reconhecidos pela Funai como povo indígena, os nativos estão avançando agora na
conquista de políticas públicas de resgate e valorização de suas tradições e
ancestralidade e também de direitos básicos como saúde e educação. Inspirados
na experiência exitosa do movimento indígena de Canguaretama, Tapuias e poder
público dialogam para implementar no Tapará a primeira Escola Indígena de
Macaíba. O acesso a uma unidade de ensino diferenciada,
intercultural, bilíngue/multilíngue e comunitária, é um direito dos povos
nativos amparado pela Constituição Federal, LDB, Lei 11.645/2008 e pelo Decreto n.
26/1991, entre outras legislações
específicas.
Na comunidade do
Tapará o ensino indígena ocorrerá na Escola Municipal Luis Cúrcio Marinho, que
ainda é uma unidade de ensino regular de Macaíba. Segundo informou o secretário
de Educação de Macaíba, o Sociólogo Domingos Sávio de Oliveira, a transformação
deste estabelecimento em escola indígena teve início há pouco tempo porque o
município não tinha sistema de ensino próprio. “Com a criação do Sistema de
Ensino de Macaíba, a Coordenação da Educação de Jovens e Adultos, EJA, recebeu
a atribuição de coordenar também a Educação Escolar Indígena, a Quilombola e a
Diversidade”, explica o secretário.
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Coord. Educ. Indígena Rogério Ferreira |
A equipe técnica, que tem à frente o
professor Rogério Ferreira, busca desde então capacitar-se para dar conta desta
demanda e tem participado de diversas capacitações e discussões sobre o tema,
estando presente, inclusive, em Encontro Nacional para implementação da
Educação Indígena, em Fortaleza. O secretário destaca a importância da parceria
com o Instituto Federal de Canguaretama, que foi essencial para a criação da
primeira escola indígena naquele município e que vem orientando os técnicos da
secretaria de educação de Macaíba.
Domingos explica que
há duas modificações a serem feitas: a burocrática e a pedagógica. A
documentação necessária à transição para escola indígena deverá ser entregue ao
Conselho Municipal de Educação até o final deste ano para análise e
deliberação. A constituição de currículo específico indígena será feita com a participação
da comunidade do Tapará. Serão realizadas audiências públicas com essa
finalidade. O secretário tranquiliza os estudantes em relação aos conteúdos da
Base Curricular Nacional. “Os conteúdos necessários à formação para os exames
federais serão mantidos no contra turno, a escola funcionará em tempo
integral”, reforça.
Já foi iniciado o debate
deste processo em audiência pública na Câmara Municipal com participação de
representantes da comunidade e do movimento indígena do Rio grande do norte.
As adequações da
secretaria de educação do município devem demorar menos de um ano para serem
concluídas. A expectativa é que a implantação ocorra até o início de 2019. Segundo
informou o Cacique Luis Catu, o processo de criação da escola indígena da sua aldeia
em Canguaretama, demorou mais de 8 anos para ser concluído. Em Macaíba, os
vereadores já reconhecem a relevância da causa e já há até proposta de
modificar o nome da escola para um nome indígena indicado pelo povo Tapuia.
Concurso
público
O secretário de
educação informou em primeira mão que o próximo concurso público a ser
realizado no município já incluirá vagas específicas para professores indígenas
visando suprir a demanda de Tapará.
A
palavra do nativo
O índio Tapuia Jerônimo
Campelo mostra com orgulho os utensílios do artesanato indígena utilizados em
suas manifestações culturais. Josué Jerônimo é filho de dona Benedita, artesã,
uma das índias mais idosas do povo Tapuia na comunidade Tapará, em Macaíba.

Ele
é funcionário de uma escola federal, mas dedica parte do seu tempo livre a dar
oficinas para resgatar e aprofundar os saberes do povo indígena. Falante e
desinibido, nos acolheu com simpatia em sua barraca na Feira Indígena do
Tapará, onde expôs a importância da educação escolar indígena para o movimento
que autodeclara e reafirma o povo do Tapará como índios Tapuia. Ele nos conta
com tristeza, e sua mãe reforça os detalhes, que as terras do Tapará, bem como
a comunidade vizinha, Lagoa do Mato, pertenciam ao povo Tapuia e que os
latifundiários vindos de fora estão desmatando e plantando capim. Perseguidos,
os índios foram se espalhando e hoje o movimento indígena tenta restaurar os
costumes e tradições e unir o povo em defesa de sua ancestralidade. Para Jerônimo,
a implantação da educação escolar indígena é essencial para formar as novas
gerações e evitar que a cultura Tapuia se perca. “É também muito importante que
o ensino seja feito por pessoas da comunidade, que leve em conta a cultura, os
costumes e as particularidades da comunidade”, complementa.
Educação
física indígena
A recreação e prática
esportiva em unidades de ensino dentro de aldeias seguem rituais próprios. E os
Tapuia tem sua contribuição a dar para o ensino da educação física.
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Corrida da tora |
Além de
praticarem a “corroveara” - Corrida da tora, esporte indígena em que correm com
um pedaço de tronco de carnaúba (tora) no ombro, os Tapuia também jogam peteca,
jogo genuinamente indígena e brasileiro que originou o esporte olímpico badmínton. Mas o
índio Jurandir Santos da Silva, ou Jurandir Tapuia, também gosta muito de futebol
e futsal. “Há quatro anos fundamos o time dos índios Tapuia e já participamos
do campeonato de Macaíba”, afirma orgulhoso o futebolista enquanto exibe a
camisa oficial da equipe e o primeiro troféu conquistado em torneio neste ano.
Mães de
alunos
Algumas mães de alunos
da escola Luís Cúrcio Marinho que ainda não se declaram indígenas afirmam que
não estão informadas de todo o processo, mas esperam que os conteúdos
necessários para os exames das escolas federais sejam mantidos, conforme
promessa do secretário. Já a mãe Adriana da Silva afirmou não se opor em nada. “Nós
somos Tapuia, acho interessante que as crianças aprendam a língua indígena. E é
muito bom que a escola seja integral porque mantém os nossos jovens na escola o
dia todo”.
Movimento
indígena do RN
José Luiz Soares, ou
Cacique Potiguara Luiz Catu, é líder do Movimento indígena do RN e esteve na audiência
pública na Câmara de vereadores de Macaíba. Ele declara que esta luta por
educação escolar indígena no Tapará é parte de um movimento maior, que começa a
se organizar ainda no ano 2000 entre os municípios de Goianinha e Canguaretama,
na Aldeia Catu.
“A busca de políticas
públicas para o povo indígena do RN intensificou-se em 2005 com a realização da
primeira Audiência pública voltada para a questão indígena na Assembléia
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Cacique Luiz Catu |
Legislativa do RN. Na ocasião apresentamos um abaixo-assinado com pontos
estratégicos da nossa luta. Reivindicávamos que os governos federal, estaduais
e municipais, além das universidades e demais instituições, reconhecessem os
povos aldeados e as etnias existentes no RN. A parti dali tivemos várias
conquistas, entre ela elas a implantação da primeira escola indígena do RN em
nossa aldeia Catu e conseguimos trazer a Funai para o RN”, relembra Luís.
Atualmente o
movimento indígena integra a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB e
tem representantes nas principais organizações e entidades de defesa dos índios
no país. No RN são realizadas assembleias a cada dois anos onde os 9 povos
indígenas tem a oportunidade de debater com todos os órgãos estaduais e
municipais as políticas públicas para a saúde, a educação e
etnodesenvolvimento. Luis se orgulha em afirmar que “já estamos na quinta
Assembleia Geral dos Povos Indígenas, na segunda Assembleia de Mulheres
Indígenas e na segunda Assembleia de Jovens Indígenas”.
A Audiência Pública
por Educação Escolar Indígena de Qualidade, realizada pela Câmara Municipal de Macaíba,
no dia 08/05, foi a terceira no estado. A primeira aconteceu em Canguaretama e
a segunda foi em João Câmara. Neste ano de 2018 várias audiências ainda serão
realizadas com o mesmo objetivo. “A Educação Escolar Indígena de Qualidade é
uma forma de mudar, de ter uma resistência maior. As escolas que atendem aos
Curumins das nove aldeias precisam se adequar às necessidades de aprendizagem
destas comunidades, conclui o Cacique Luis Catu.